Em 02/07/2017 o Respeitável Irmão
Tristão Antônio Borborema, atual Primeiro Vigilante da Loja Obreiros de Abatiá,
REAA, Grande Oriente do Paraná, COMAB, Oriente de Abatiá, Estado do Paraná,
solicita considerações:
CABALÁ E ÁRVORE DA VIDA NA MAÇONARIA.
Valendo de sua sapiência, indago ao irmão: qual a relação entre cabala,
árvore de vida e maçonaria, notadamente acerca da posição topográfica dos
cargos no Templo Maçônico e, sobretudo, influência nas instruções e filosofia?
CONSIDERAÇÕES:
Cabalá significa em hebraico “tradição”. Ela
é a mística numeral hebraica, sobre a qual existe imensa literatura a ela
consagrada desde a Idade Média.
No que diz respeito
à Cabalá e a Moderna Maçonaria,
muitos se inspiraram nela interpretando-a e coligando-a, em tese, como símbolos
maçônicos compostos por “números sagrados cabalísticos”. Especulativamente
deram a eles propriedades intrínsecas de entidades abstratas.
Obviamente essas
são teses de ocultistas, a exemplo de Osvald Wirth que consagrou muitos dos
seus escritos à gnose numeral e a relacionou indiscriminadamente à Maçonaria.
Não é preciso dizer que essa concepção particular, além do que está previsto no
judaísmo, jamais foi apresentada pela Maçonaria autêntica. Na verdade a
numerologia é modelo de teóricos que tentam integrá-la ao simbolismo maçônico em
nome das ideias individualistas.
Embora sejam
inegáveis influências do pensamento humano sobre a Moderna Maçonaria, a exemplo
do misticismo religioso hebraico, isso não nos autoriza imaginar que esses
costumes sejam propriedade da Ordem Maçônica e muito menos imaginá-las como ícones
de ancestralidade maçônica.
Na realidade uma
visão assim distorcida serviria apenas para subverter a ordem dos elementos que
constroem a história autêntica.
Dentre tantas manifestações e culturas
que influenciaram a construção da doutrina maçônica, tal como o hermetismo, o
pitagorismo, os mistérios órficos, o rosacrucianismo, a alquimia, etc., a
influência místico-religiosa da cultura hebraica se constitui talvez no
elemento mais importante na formação das alegorias e simbologia de muitos ritos
que constituem a Maçonaria, a exemplo do Tabernáculo e posteriormente do Templo
de Jerusalém.
Uma explicação sintética sobre a
Cabalá:
Essência do
misticismo hebraico é uma das interpretações esotéricas da Torá (cinco
primeiros livros bíblicos), ou o Pentateuco. Embora tenha sofrido inúmeras influências
de outras culturas na Idade Média, a Cabala hebraica, ainda assim conservou a
sua primitiva originalidade e profundidade espiritual como característica do
judaísmo.
Composta por temas
específicos, suas fontes de pensamento se compreendem pelo Apocalipse – juízo final e o fim dos tempos; pela Visão da Merkabá – o trono de Deus, conforme
Ezequiel, cap. 1; pela Halaká –
alicerce dos princípios religiosos e comentários legislativos sobre as partes
jurídicas da Torá e pela a Hagadá, cujo
significado é “lenda” e alimentou extensamente a fonte mística cabalística.
Os dois principais
textos cabalísticos do judaísmo são: o
Sepher Yetsira (Livro da Criação) e o Sepher
há Zóar (Livro do Esplendor).
O Livro da Criação revela, sob o
ponto de vista místico, uma compreensão filosófica da formação do universo
considerando que os elementos formadores do mundo são subordinados aos dez
números fundamentais (sephirot = número
em hebraico) e às vinte e duas letras do alfabeto hebraico, cujas quais
envolvem forças cósmicas inatingíveis em combinações que podem variar pela
influência da criação.
O Livro do
Esplendor, tido como obra canônica máxima do judaísmo, possui função objetiva de
fazer a descrição da vida interior de Deus, além de traçar o caminho do ser
humano que o leva à união com a divindade. Conforme o Zóar a alma humana se compõe em alma vegetativa (néfeque), alma intelectual (rouá) e sopro, ou alma espiritual (nechamá), cujas quais correspondem aos três graus da alma em suas relações com
o mundo superior e inferior.
Relação da Cabala com a Moderna
Maçonaria:
Sob o ponto de
vista especulativo, onde muitos graus maçônicos são influenciados pelo
misticismo da Cabalá,
inquestionavelmente deles o mais cabalístico é o de Companheiro onde interessa
a dualidade do Ser e do Não-Ser encontrado no Yetsira (Livro da Criação) e a tríplice
composição da alma humana conforme expressa o Zóar (Livro do Esplendor) – vide as obras dirigidas à Maçonaria como
Shemá Israel e Herança Hebraica na Maçonaria de autoria de José Castellani.
Na relação do
misticismo cabalístico está a metafísica do Tabernáculo que na realidade é o
precursor do Templo de Jerusalém erigido pelo Rei Salomão, cujo qual seria
adotado pela Maçonaria como uma das suas maiores alegorias, dando-lhe
sustentáculo à toda disciplina moral, ética e sociológica condensada na Lenda
Hirâmica.
O Tabernáculo, base
elementar para o estudo da Cabalá
(tradição), era um templo portátil que ia armado no deserto nos tempos em que
os hebreus se deslocavam do Egito para a Palestina (Êxodo – segundo livro da
Torá).
Em uma praça de 100
por 50 côvados cercados por sessenta postes, nos quais se prendia uma grande
cortina com abertura na parte oriental, no seu lado oposto ia montado o
Tabernáculo, ou tenda (suká em
hebraico), tendo ele na sua entrada uma bacia de bronze com água para as
abluções, enquanto que no meio do recinto ficava a mesa dos holocaustos.
O Tabernáculo em si
era composto por quatro tendas sobrepostas e tinha duas divisões internas: a
primeira, denominado Santo (Kodesh, em
hebraico) continha a mesa dos perfumes, a mesa dos pães da proposição e o
candelabro de sete braços (Menorá, em
hebraico); a segunda, o Santo dos Santos (Kodesh
há Kodashin) contendo a Arca da Aliança que guardava as Tábuas da Lei, a
Urna do Maná e a Vara florida de Aarão.
Na metafísica do
Tabernáculo aplicada ao Cosmos, às três divisões (Santo e Santo dos Santos) representam
as três divisões do Universo: céu, terra e mar. Os quatro tecidos usados na
confecção das quatro tendas sobrepostas, simbolizam cada uma os quatro Elementos
da Antiguidade: ar, água, terra e fogo.
O candelabro de sete braços representa os sete planetas da Antiguidade e a luz
dos astros oriundas do Sul; a mesa dos pães da proposição simboliza as benesses
dos ventos setentrionais que trazem as chuvas vivificando as plantações.
Ainda somam-se a
esse ponto de vista metafísico, as vestes do sumo sacerdote (Cohen gadol = sumo sacerdote em
hebraico) na qual sua sobrepeliz era de matiz azul e dourado, guarnecido com
flores, romãs e campainhas de ouro; havia também doze pedras preciosas; nos
ombros iam duas esmeraldas; uma mitra, na qual iam gravadas as quatro letras Iôd, Hé, Vav, Hé, o nome inefável de
Deus.
A cor azul da sobrepeliz
representa o ar; as romãs, a água; as flores, a terra; as campainhas, a
harmonização entre a terra e a água (onde vivifica a Natureza); as doze pedras
representam os doze signos zodiacais e as doze tribos de Israel; as duas
esmeraldas denotam as duas grandes luminárias – o Sol e a Lua, o dia e a noite
e os dois hemisférios da Terra; a mitra representa Deus, o macrocosmo, sem o
qual o microcosmo, representado por todos os seres vivos, não poderia existir.
Assim, o
Tabernáculo, ancestral do Templo de Jerusalém, traduziu a interpretação
cabalística associando o Templo à construção do mundo e, por extensão do homem.
A Cabalá, embora bastante antiga e de uma
época em que os essênios e os filisteus a transmitiam oralmente, somente se
consolidaria já da Idade média, mais precisamente na época talmúdica nos
séculos IV e V, período da concretização do Talmude.
A sua doutrina mística busca analisar o homem, objeto da criação, em sua
relação suprema com Deus, estudando o Cosmos sob dois aspectos principais: na
História da Criação e na História do Carro, ou Trono de Deus.
Foi por esse entendimento
que alguns ritos maçônicos formataram o misticismo do Templo Interior do Homem
admitindo-o à correlata construção e dedicação do Templo de Jerusalém a Deus, o
que em primeira análise, exprime a ideia de o homem servir como morada do divino.
De todo o contexto
cabalístico o que mais se associa à doutrina maçônica, sem dúvida é o Livro do
Esplendor (Sepher ha Zóar) cujo texto
teria surgido na Espanha em 1275.
Na realidade essa
obra tem o caráter de descrever a vida interior de Deus, ao mesmo tempo em que
traça o caminho do ser humano em direção à união mística com a divindade. Em síntese
o Sepher ha Zóar apresenta o
incognoscível do Criador (En Soph)
nas relações com o universo e com o homem e, para tal, utiliza-se das dez sephirot (números), cujas quais se integram
aos dez atributos fundamentais da vida divina segundo a Cabalá.
Essa doutrina divulga
sistematicamente a existência de dois mundos relacionados à divindade: um deles
relacionado com o En Soph que é
totalmente inacessível à mente humana, enquanto que o outro - visto sob a
óptica dos dez atributos - se encontra abaixo do primeiro e é assim acessível à
mente humana permitindo o conhecimento de Deus.
Na realidade esses
dois mundos se agregam num só e dão ao mundo inferior, mesmo que de modo
periférico, a percepção da existência de atividade no incognoscível.
Essa celeridade permitida
do En Soph que é percebida pela mente
humana se manifesta através das sephirot,
cujo método potencial permitiu aos cabalistas, segundo essa doutrina, a fazer
uso do antropomorfismo para esclarecer muitos dos símbolos da Torá. Em tese as sephirot se transportam para a efígie
antropomórfica.
Segundo a Torá, no
Livro de Gênesis, o homem foi criado à imagem e semelhança de Deus, o que lhe
permite possuir o sopro da divindade como um traço do Criador na criatura.
Mesmo que o homem terrestre seja possuidor de muita materialidade e careça de
um aperfeiçoamento futuro.
Assim, esse homem
que no futuro estará aperfeiçoado, será o Messias, o Ungido, ou o correspondente
ao Adam Kadmon que é reflexo da alta
espiritualidade. É a marca da alma no Zóar
(esplendor).
Por esse ponto de
vista, o microcosmo, que é o organismo humano, sendo cópia do macrocosmo (de
Deus), pode ter uma precisa representação se construída pela organização das
dez sephirot. Embora Deus não possa
ser representado sob nenhuma forma, Ele é, entretanto simbolizado pelo Adam Kadmon.
Assim, no Zóar essa construção antropomórfica incorpora
vários nomes às sephirot
contextualizando uma figura humana que representa a alta espiritualidade (Adam Kadmon).
Conforme essa
organização contextual as sephirot
assim se organizam: Kéter (coroa), Hokmá (sabedoria), Biná (inteligência), Hessed
(graça), Tiferet (beleza), Din (justiça), Netsa (vitória), Iesod (fundamento),
Had (majestade), Malkut (reino).
Nessa ordem
sequencial as nove primeiras sephirot formam três tríades, sendo a
primeira àquela que forma o Mundo da Inteligência (Olan ha Muscal); a segunda, o Mundo do Sentimento (Olan ha Murgake); a terceira o Mundo da
Natureza (Olan ha Mutba’a).
A décima sephirá (singular de sephirot) que é o Reino encerra as qualidades
das demais sephirot e as transmite à
criatura humana.
É por intermédio da
alta espiritualidade do Adam Kadmon que, segundo a Cabalá, em uma união mística ocorre à absoluta
correspondência entre Deus e o homem.
Sob o aspecto
cabalístico o mundo surge na Cabalá
como uma verdadeira cosmogonia onde a essência do homem reside na alma que
aparece nessa tríplice forma, ou alma vegetativa, alma intelectual e alma
espiritual (Néfeque, Rouá e Nechamá).
A Cabalá é uma doutrina especialmente de
difícil compreensão e relegada a poucos sábios pertencentes ao judaísmo que verdadeiramente
a compreendem. Não há como confundi-la com ilações exaradas por charlatães que
a evocam como ciência de adivinhação e construção de destinos apropriados
àqueles que se alimentam de superstições.
Na Maçonaria ela
ingressou na Europa do século XVIII quando da profusão dos ritos onde diversas
manifestações do pensamento humano passaram a integrar o corolário especulativo
da Ordem.
O REAA\ por exemplo, longe de crendices e
adivinhações, segue de perto a Cabalá em
muitos dos seus conceitos doutrinários, mas metodologicamente na busca
incessante da Verdade e da Sabedoria e sem o desiderato de transformar a Loja
em palco para pregações particulares.
Note-se entre a metafísica cabalística e a
Maçonaria a relação com o conceito da tríplice conotação da alma humana e o
Infinito, mas não admitindo a acessibilidade à interminável sabedoria divina (o
uso do chapéu é um dos símbolos dessa submissão).
Outro exemplo de
alegoria cabalística na Maçonaria está na abertura do Compasso sobre o Livro da
Lei como símbolo exotérico do
Conhecimento e esotérico do espírito.
Ensina-se no simbolismo que o Compasso, aberto geralmente em 45º, vai no máximo
à abertura de 90º, o que concebe a limitação do conhecimento humano perante a
onisciência divina que é representada pelos 360º da circunferência.
É fácil de perceber
que por essa exposição uma boa parte do misticismo maçônico tem o pé assentado
na mística hebraica, sobretudo nessa relação entre o macrocosmo (universo) e o
microcosmo (o homem como ser vivo), cuja alegoria maior é o Templo
representativo da obra perfeita dedicada a Deus.
Na concepção
antropomórfica do Adam Kadmon os atributos divinos se organizam
no espaço por ele representado, surgindo inclusive, às vezes à interpretação
pouco convincente por parte de alguns autores alegando que as distribuições dos
cargos da Loja coincidem com as sephirot como
a árvore da vida, o que parece ser mais especulação do que verdade, já que pela
variação de distribuição dos lugares e a decoração das Lojas correspondentes
aos diversos ritos maçônicos praticados, nesse sentido não existir homogeneidade.
Embora a Cabalá influencie e dê suporte a muitos
aspectos doutrinários maçônicos, como já mencionados, nos parece estarem longe de
comparar elementos decorativos, cargos, lugares e outros mobiliários da Loja
com as dez sephirot.
O Templo espiritual
em si é a morada do divino, do sagrado, mas nunca ao ponto de detalhá-lo como
árvore da vida. O Templo, sob o ponto de vista esotérico, é um ícone do conjunto cabalístico para a Maçonaria,
porém nunca a laudatória representação dele ser o Adam
Kadmon.
Na verdade a
autenticidade cabalística não pode ser confundida com modelos numerológicos de
teóricos que querem afoitamente integrá-la ao simbolismo maçônico em nome das
ideias individualistas.
Concluindo, pelo
que foi aqui exposto, a influência do misticismo religioso hebraico, em
particular a Cabalá, é importante
elemento existencial que dá suporte à doutrina Maçônica, entretanto não deve
existir licenciosidade de entendê-los como elementos cabalísticos e entidades
que influenciam o desenvolvimento da ritualística maçônica. Em síntese, o
arquétipo ritualístico maçônico não é mero elemento cabalístico, embora ele
possa até mesmo constituir parte desse organismo.
T.F.A.
PEDRO JUK
SET/2017
Boa noite querido ir.'. ! GOSTARIA de saber como posso adquirir o livro ?
ResponderExcluirMano, eu não entendi que livro o Irmão se refere. Se é sobre a Calabalá sugiro que faças uma pesquisa no mercado liveiro. Se forem obras do Castellani que abordam esse tema, contacte a Editora Maçônica A
ExcluirTrolha - www.atrolha.com.br
Irmão pedro, e com muita satisfação que venho por este meio espressa minha gratidão por estar elevando meu conhecimento com a cabala. Gostaria de receber resposta do irmão . Jonasjoias0000@gmail.com
ResponderExcluirCaro Irmão...li uma matéria sua sobre as "velas" no Altar dos Juramentos...consulto a possibilidades de rever essa matéria...que ñ mais encontrei..obrigado Roberto MM.:€
ResponderExcluirEu não entendi. Essa matéria e da minha autoria?
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