quarta-feira, 3 de outubro de 2018

PERÍODOS HISTÓRICOS DA MAÇONARIA


Em 09/07/2018 o Respeitável Irmão Leonardo Mendes, Secretário Estadual Adjunto do Grande Oriente do Paraná, COMAB, Oriente de Curitiba, Estado do Paraná, pede informações sobre o que segue:

PERÍODOS HISTÓRICOS DA MAÇONARIA.


Gostaria que o Irmão comentasse sobre os períodos da história da Maçonaria enfocando o período Operativo e Especulativo.

CONSIDERAÇÕES

Antes das considerações propriamente ditas, é preciso que o estudante de Maçonaria, sob o ponto de vista autêntico, se desvencilhe das fantasias ou falsas interpretações que ocorrem por conta das alegorias utilizadas pela Maçonaria. Assim, alegorias não podem ser tomadas como afirmações histórias. Alegorias são sim utilizadas como artifício instrutivo, nunca como afirmação da ocorrência de um fato.
Dados esses primeiros comentários, segue um resumo simples e objetivo de aspectos que viriam, mais tarde, em redundar na Maçonaria que vivemos e conhecemos na atualidade – a Moderna Maçonaria.

As Organizações de Ofício como nossas antecessoras.
A arte de construir, não propriamente a Maçonaria, advém dos tempos em que o homem deixou as características nômades de viver nas cavernas, para viver numa sociedade estratificada. Embora não existisse ainda na época o sentido de organização profissional que pudesse regular o conceito do ofício, a necessidade fez com que viessem aparecer os primeiros profissionais dedicados à construção. Começava então a ereção de vivendas e moradias que se tornariam mais tarde em aglomerações urbanas.
Collegia Fabrorum - Em termos de organização profissional, foi no Império Romano do Ocidente que, em função das atividades de conquista, veio aparecer no século VI a. C. a primeira associação organizada de construtores. Conhecida como os Collegia Fabrorum, os seus membros eram os Collegiati. Na realidade essas associações acompanhavam as legiões romanas na intenção de reconstruir aquilo que a atividade bélica havia destruído durante as conquistas.
Eram dotadas de forte caráter religioso, ao mesmo tempo davam ao trabalho um cunho sagrado prestando culto às suas divindades. De caráter inicial politeísta, essa associação acabou se tornando, pela expansão do Cristianismo, monoteísta, entrando em decadência após a queda do Império Romano do Ocidente em 476 d. C. Embora o declínio, ainda assim persistiram pequenos grupos dos Collegia no Império Romano do Oriente, cujo centro era Constantinopla.
Associações Monásticas – É na Idade Média, por conta do grande poder exercido pela Igreja Católica e no intuito de preservar a Arte Real entre os construtores do norte da Europa é que viria aparecer a Maçonaria de Ofício, ou Operativa. Assim, a partir do século VII surgiam as Associações Monásticas.
Formadas quase que na sua totalidade por clérigos que dominavam a arte da construção, os segredos do ofício ficavam restritos aos conventos. Isso se explica porque numa época em que a Europa estava em ruínas pelas sucessivas invasões bárbaras, onde as guerras, os saques e os roubos eram frequentes, os artistas e os arquitetos buscavam refúgio em lugares seguros, geralmente encontrados nos conventos e abadias.
Com a expansão da Igreja-Estado, o que resultou na falta de mão de obra, os frades construtores se viram obrigados a preparar leigos para desempenhar o ofício da construção, o que proporcionaria, já no século X, o aparecimento de organizações que ficariam conhecidas por Confrarias Leigas. Essas confrarias, mesmo constituídas por leigos, continuavam a receber forte influência eclesiástica de onde haviam aprendido o ofício, mantendo assim forte apelo religioso dado ao trabalho.
Convenção de York – É nesse período que se realiza a Convenção de York na Inglaterra, cuja mesma seria considerada como a primeira reunião de operários construtores. Ocorrida em 926 d. C. à época do Rei Athelstan, essa Convenção buscava reparar os inúmeros prejuízos que as associações haviam tido por conta das sucessivas invasões bárbaras advindas do norte. Nela, segundo historiadores, fora apreciado e aprovado um estatuto que ficou conhecido como a Carta de York, o que, em primeira instância, serviu como norma regulamentar para as confrarias de ofício e transformou a cidade medieval de York como uma espécie de Meca da Maçonaria Operativa.
As Guildas – Aproximadamente nesse período é que associações simplesmente religiosas formariam, a partir do século XII, corpos profissionais que ficaram conhecidos como Guildas. Deve-se a elas o uso da palavra Loja como corporação e local de trabalho. Na realidade as Guildas, junto com os Ofícios Francos podem ser consideradas como os verdadeiros ancestrais da Moderna Maçonaria.
Dentre outras particularidades, deve-se a elas os brindes e homenagens aos deuses, aos antepassados e aos heróis. Era comum nelas seus participantes se comprometerem a defender uns os outros como irmãos se socorrendo mutuamente. Assim, as Guildas se caracterizavam pela prática de recíproco auxílio, reuniões em banquete e por atuação em reformas políticas e sociais.
Introduzidas na Inglaterra, elas acabariam modificadas por influência do cristianismo, embora mesmo assim não fossem bem vistas pela Igreja, o que se explica pelas suas origens pagãs e muito possivelmente pelas reformas políticas e sociais, sobretudo naquilo que diminuía os privilégios do clero. Subsistindo a antipatia da Igreja e evitando hostilidades, as Guildas acabariam se desenvolvendo sob a proteção de um monarca e de um santo protetor.
Canteiros – Ainda no século XII, associadas às Guildas, apareceria uma associação de operários alemães intitulados Steinmetzen, ou Canteiros, que alcançariam notoriedade quando da construção da Catedral de Estrasburgo.
Sob a direção de Erwin de Steinbach, o mesmo deu um aprimorado sistema organizacional aos seus obreiros. O termo “canteiro” designa o operário que trabalha em cantaria, esquadrejando a pedra tornando-a lavrada para que possa ser utilizada como matéria prima nas construções.
Ofícios Francos, ou a Franco-Maçonaria – Também no século XII floresceria a associação tomada como a mais importante do período do ofício e que ficou conhecida como os Ofícios Francos (Franco-Maçonaria).
Constituídos por artesãos privilegiados isentos de obrigações e impostos reais, feudais e eclesiásticos, bem como possuíam liberdade de locomoção, eles eram construtores categorizados diferentes daqueles que estavam servos e que ficavam presos às obrigações impostas pelo seu senhorio. Destaque-se que na Idade Média o termo “franco” designava não só aquele que era livre em oposição ao servil, mas também todos os indivíduos e bens que escapavam às servidões e direitos senhoriais.
É sob essa concepção que aparecem os “pedreiros-livres”, conhecidos na França como franc-maçons e na Inglaterra como free-masons.
Há que se considerar que o maior poder político da época era a Igreja e era ela que concedia privilégios, sobretudo pela sua ascendência sobre os governantes medievais.
Cabe mencionar que nessa fase primitiva e antes da formação apropriada das Lojas, não se pode imaginar uma Maçonaria tal qual a conhecemos atualmente. Ela não era uma sociedade secreta, pois o segredo, a principio, nada mais era do que uma forma de reconhecimento entre os seus membros que guardavam - de modo velado - os planos para a construção. Nada havia de esotérico e nem existiam recintos decorados com símbolos.
Estilo Gótico – Ainda no século XII, um importante estilo arquitetônico denominado gótico, ou germânico apareceria, primeiro no norte da França e por fim espalhando-se pela Inglaterra, Alemanha e outras regiões da Europa. De importâ
ncia primordial, esse estilo arquitetônico seria adotado pelas confrarias de construtores a tal ponto que as suas regras básicas foram ensinadas nas oficinas dos canteiros, ou cortadores da pedra. Destaque-se que esse estilo foi tão importante para os canteiros medievais que no século XVI, quando da sua decadência, ele acabou selando o declínio das corporações de construtores.
A Companhia dos Maçons de Londres – Em 1220 (século XIII) apareceria em Londres, sob o reinado de Henrique III, a corporação de pedreiros denominada The Holy Craft and Fellowship of Masons (A Santa Arte e Associação dos Pedreiros). Essa associação é tida por alguns autores como um marco referencial para a Maçonaria.
Posteriormente, já no ano de 1275, na intenção de terminar a ampliação das obras da Catedral de Estrasburgo, iniciada em 1015, Erwin de Steinbach convoca a Convenção de Estrasburgo para a qual afluíram famosos arquitetos da Alemanha, Itália e Inglaterra.
Naquela oportunidade fora especialmente criada uma Loja para discutir os planos e andamento dos trabalhos, quando então Erwin seria aclamado como o Mestre da Cátedra.
É bom que se diga que naquela época Lojas eram criadas com o desiderato de tratar de uma obra específica – foi o caso daquela criada para a construção da Catedral de Estrasburgo.
Nessa época, sobretudo na Inglaterra, os operários das corporações costumava utilizar recintos localizados nas tabernas e hospedarias para se reunir e discutir planos das construções.

A Decadência das Corporações de Ofício.
A partir dos meados do século XVI, sobretudo pelas perseguições e calúnias sofridas por parte do clero, as corporações de ofício começavam a entrar em declínio. Em 1539, Francisco I, rei da França revogava por decreto os privilégios concedidos aos maçons. Eram assim abolidas as Guildas e demais fraternidades, passando as corporações de artesãos a serem regulamentadas. Na Inglaterra, por exigência de Londres, os franco-maçons eram tratados como operários ordinários (sem privilégios). Em 1558 a rainha Izabel mantinha a proibição sobre a realização de qualquer assembleia, sob a pena de trata-la como rebelião. Somente em 1562, por influência de Thomas Sackville, adepto da arte de construir, é que a rainha acabaria revogando essa ordenação.
Embora os esforços auferidos pelos franco-maçons para manter o prestígio dos construtores e artesãos, a exemplo da Convenção da Basileia realizada em 1563, o declínio das corporações era latente no século XVI. A Renascença com o renascimento da arte greco-romana acabaria relegando os arcos ogivais do estilo gótico. Na Inglaterra, por obra de Ínigo Jones era introduzido o estilo renascentista sepultando de vez o estilo gótico, apressando com isso a decadência das corporações inglesas dos franco-maçons. De certo modo, as corporações perderiam o seu objetivo inicial e acabariam paulatinamente se transformando numa sociedade de auxílio mútuo, o que traria para os seus quadros elementos não ligados à arte de construir, ou seja, não profissionais, os quais eram chamados de maçons aceitos, ou especulativos.

Transformação da Maçonaria de Ofício em dos Aceitos
Dado ao declínio das corporações, as mesmas, por questão de sobrevivência, começaram paulatinamente a admitir homens estranhos ao ofício. Assim, eram selecionados homens pelos seus dotes culturais e pela sua condição aristocrática. Obviamente que isso era um artifício para manter o prestígio da confraria e ganhar proteção. Na realidade era uma tentativa para superar a decadência.
O primeiro caso de um maçom aceito (especulativo) que se tem registro é o de John Boswell, lorde de Aushinleck, ou, segundo J. G. Findel, sir Thomas Rosswell, esquire de Aushinleck que, a 8 de junho de 1600 (século XVII) foi recebido como maçom aceito na Saint Mary’s Chapell Lodge em Edimburgo na Escócia. Essa Loja fora criada em 1228 quando da construção da Capela de Santa Maria e tinha o fito de reunir operários para discutir o andamento das obras.
A partir daí, esse processo que havia se iniciado na Escócia, acabaria por se espalhar pelas corporações de construtores. Assim, já no final do século, o número de maçons aceitos (especulativos) ultrapassava em muito o número de maçons operativos. Dos aceitos mais famosos, cite-se Willian Wilson, Robert Murray, Henry Mainwairing, Elias Ashmole, dentre outros.
Grande Incêndio em Londres – Devido ao sinistro ocorrido no ano de 1666, os franco-maçons acabaram recuperando parte do seu antigo prestígio. Em 2 de setembro daquele ano, Londres teve aproximadamente quarenta mil casas e oitenta e seis igrejas destruídas pelo fogo. Dado a isso e sob a direção do renomado arquiteto do rei, sir Christopher Wren, os maçons acorreram para participar do esforço de reconstrução da cidade, sendo que a principal obra de Wren foi a reconstrução da Igreja de São Paulo, em cujo adro, em 1691, se estabeleceria uma Loja de fundamental importância para a História da Moderna Maçonaria - a Loja S. Paulo.
A reconstrução de Londres somente se daria no ano de 1710
Essa Loja teve o seu nome em homenagem a Igreja São Paulo e ficou também conhecida como a Loja da taberna o “Ganso e a Grelha”, que se distinguiria como local de reuniões de caráter informal e administrativo.
A Primeira Grande Loja (Moderna Maçonaria) – Como comentado, era costume que os maçons da época se reunissem em tabernas ou nos adros das igrejas. Não existiam ainda Templos Maçônicos – o primeiro somente seria inaugurado em 1776.
Entenda-se que nesses tempos as cervejarias e hospedarias, sobretudo na Inglaterra, possuíam um caráter social muito grande e comumente eram usadas para exposição e troca de ideias entre intelectuais, artífices, trabalhadores do mesmo ofício, etc.
A Loja “The Goose and Gridiron” (o Ganso e a Grelha), ou Loja São Paulo, fora constituída inicialmente apenas por maçons de ofício que participaram da reconstrução de Londres. A partir de 1703 ela resolvia também admitir homens aceitos de todas as classes sociais e, sem qualquer restrição, promovia uma reforma estrutural que daria suporte para a Moderna Maçonaria. Foi nela que em 1709 se deu a admissão do reverendo Jean Théophile Désaguliers, cujo ingresso iria apressar amplamente o processo de transformação da Maçonaria, destacando-se que Désaguliers seria um dos seus grandes líderes.
Assim, no início de 1717, Désaguliers acabaria reunindo quatro Lojas metropolitanas no intuito de traçar planos para a reestruturação maçônica que se avizinhava. Para tal foi então convocada uma reunião dessas quatro Lojas existentes em Londres, o que se daria no dia 24 de junho daquele ano.
Essa reunião se deu nas dependências da taberna “The Apple Tree” (A Macieira) e ali compareceram, além da Loja “The Goose and Gridiron” (O Ganso e a Grelha), também a da Cervejaria “The Crown” (A Coroa) e a da taberna “Rummer and Grappes” (O Copázio e as Uvas).
No dia 24 de junho de 1717, data comemorativa a São João, como fora previsto, as quatro Lojas metropolitanas se reuniam e criavam “The Premier Grand Lodge” (a Primeira Grande Loja) em Londres, inaugurando o primeiro sistema obediencial com Lojas subordinadas a um poder central dirigido por um Grão-Mestre.
Esse é considerado o marco da Moderna Maçonaria, já que antes disso as Lojas eram livres de qualquer subordinação externa – “o maçom livre na Loja livre”. Sem dúvida esse fato foi uma verdadeira revolução, sobretudo pela alteração na estrutura maçônica tradicional.
A partir desse acontecimento, a história da Moderna Maçonaria iria adquirir outro capítulo na concepção especulativa, o que, num breve resumo, iria resultar nas escaramuças entre a Grande Loja dos Modernos de 1717 e a Grande Loja dos Antigos de 1751 até que, em novembro de 1813 fosse assinado o Ato de União entre as duas Grandes Lojas rivais quando então surgiu a Grande Loja Unida da Inglaterra.
Esses quase cem anos de história, contados desde a fundação da Primeira Grande Loja até o Ato de União, merecem capítulo a parte, porém não fazem parte desses comentários.
Conclusão.
Por tudo aqui comentado, esse resumo despretensioso nos leva a concluir que nos seus aproximados 800 anos de história, a Maçonaria, sob o ponto de vista autêntico (documental) se divide em Operativa, ou de Ofício e a dos Aceitos, ou Especulativa. Assim, até o século XVII as Lojas eram essencialmente dedicadas à construção, cujo componente humano se distribuía em verdadeiros corpos profissionais. Era a Maçonaria Operativa.
Já a partir do ano de 1600, com a aceitação do primeiro elemento estranho ao ofício, iniciava-se o período especulativo, ou a Maçonaria dos Aceitos. Esse sistema se desenvolveria paulatinamente até que toda a composição dos quadros maçônicos se constituísse por maçons aceitos.
Cabe por fim mencionar que a Maçonaria Especulativa, a partir do ano de 1717, com a fundação da Primeira Grande Loja em Londres, passa a ser conhecida como Moderna Maçonaria, sobretudo por se adequar às reformas estruturais exigidas pelo inaugurado sistema obediencial de então. Destaque-se que a Moderna Maçonaria continua sendo composta apenas por maçons especulativos (aceitos).
Outros apontamentos a respeito podem ser encontrados no livro de minha autoria intitulado Exegese Simbólica para o Aprendiz Maçom – Tomo I, Editora Maçônica A Trolha, assim como apontamentos deixados pelo saudoso Irmão José Castellani in “Maçonaria: Uma História sem Mistério”.



T.F.A.

PEDRO JUK


OUT/2018

Um comentário:

  1. Parabéns, Ir.'., foi esclarecedor sem ser enfadonho e sucinto sem ser lacônico. T.'.F.'.A.'.

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