quarta-feira, 30 de maio de 2018

TRANSMISSÃO DA PALAVRA SAGRADA - ELA VAI E RETORNA?


Em 01/04/2018 o Respeitável Irmão Hélio Brandão Senra, Loja União Força e Liberdade, 272, sem mencionar o nome do Rito e o Oriente, Grande Loja Maçônica de Minas Gerais, Estado de Minas Gerais, solicita a seguinte informação:

TRANSMISSÃO DA PALAVRA SAGRADA - VAI E RETORNA?


Meu Irmão gostaria de saber o histórico da transmissão da palavra sagrada e qual a razão do Rito Brasileiro praticar o retorno da palavra ao encerramento dos trabalhos.

CONSIDERAÇÕES.

Antes dos comentários pertinentes à questão, é bom que se diga que essa transmissão de Palavra nada tem a ver com telhamento maçônico. Essa transmissão é parte de uma alegoria que se dá entre Mestres Maçons, a despeito de que cargos em Loja são privativos apenas daqueles que alcançaram o Terceiro Grau. Ratifica-se: essa transmissão não é uma ação de reconhecimento, mas um procedimento de alto significado iniciático, como se verá a seguir.
Dados esses comentários preliminares, vamos ao tema propriamente dito.
A transmissão da Palavra Sagrada na abertura e encerramento dos trabalhos é prática original do REAA\ que, pelo título “antigo” que traz em seu nome, justifica a rememoração dos costumes operativos. Embora de origem francesa, portanto latino, o escocesismo historicamente possui também particularidades inerentes à Maçonaria anglo-saxônica.
Assim, essa liturgia alude aos tempos da Maçonaria de Ofício, ou Operativa (dos antigos). Naqueles tempos, o Mestre da Obra operativo (ancestral do Venerável Mestre), durante a construção no imenso canteiro de obras, se comunicava com seus auxiliares imediatos (Wardens – atuais Vigilantes) utilizando-se dos seus mensageiros, ou “oficiais de chão” (ancestrais dos Diáconos).
Dentre as comunicações enviadas pelos mensageiros, uma delas se dava constantemente antes do início dos trabalhos, cujo desiderato era o de enviar ordens aos seus Vigilantes para que eles executassem a preparação para o trabalho nivelando e aprumando os cantos da obra.
Nesse sentido, os Vigilantes cumpriam a ordem executando a aprumada e o nivelamento dos cantos a partir da pedra angular aonde ia fixado o cordel para se aplicar a 47ª Proposição de Euclides – além do nivelamento e aprumada também se conferia o esquadro (canto).
Estando tudo pronto, nivelado e aprumado, os Vigilantes por fim comunicavam o Mestre da Obra, através dos mensageiros (Diáconos), que tudo estava de acordo e pronto para que os trabalhos se iniciassem.
Ao se comunicar como o Mestre da Obra, os Vigilantes enviavam mensagem dizendo que tudo estava “justo e perfeito”. Recebida essa comunicação, o Mestre então declarava abertos os trabalhos no canteiro (atual Loja).
É dessa prática a origem do termo “justo e perfeito” na Maçonaria, assim como a adoção pela Moderna Maçonaria do Nível e do Prumo como joias distintivas dos seus Vigilantes especulativos.
Já quando do encerramento da jornada de trabalho, novamente o Mestre da Obra, utilizando-se do oficial de chão (Diácono), enviava ordens aos seus Vigilantes para que tudo agora fosse conferido novamente, oportunidade em que os Vigilantes, cada qual pela sua banda no canteiro, percorriam a construção conferindo se todas as paredes estavam niveladas, aprumadas e concordantes com todos os cantos esquadrejados.
Certificando-se que tudo estava nos conformes, os Vigilantes comunicavam novamente o Mestre da Obra que os trabalhos estavam “justos e perfeitos”, pelo que ele então ordenava ao Primeiro Vigilante que fechasse a Loja, pagasse os obreiros e os despedisse contentes e satisfeitos. Cumprindo a ordem, o Vigilante assim procedia, mas não sem antes recomendar aos operários que após o inverno retornassem para a próxima jornada de trabalho.
Esse comentário explica muitos procedimentos ritualísticos relacionados à liturgia de abertura e encerramentos dos trabalhos conforme o Ritual.
Como mencionado, tudo isso se dava nos canteiros operativos da Francomaçonaria.
Com a decadência dessas corporações de ofício e o aparecimento da Maçonaria Especulativa, muitos desses costumes seriam lembrados na Moderna Maçonaria por alegorias ritualísticas, como é o caso do que acontece no REAA\ e a transmissão da Palavra Sagrada para a abertura e encerramento dos trabalhos.
Entretanto, em se tratando de Maçonaria Especulativa, o simbolismo revive práticas por alegorias, já que nesse caso, a construção não mais é de igrejas, abadias e catedrais, mas do próprio homem. Assim, o canteiro é a sala da Loja (Templo) e o maçom a matéria prima utilizada no lugar da pedra calcária de antigamente.
Por esse feitio, o REAA\ utiliza simbolicamente, no lugar dos literais nivelamentos e aprumadas dos cantos, uma Palavra que, se transmitida corretamente significa que tudo está “justo e perfeito” para se iniciar os trabalhos especulativos da Loja, bem como que ao final verifica se tudo está nos conformes para o seu encerramento.
Em linhas gerais a transmissão correta da Palavra Sagrada é a conferência simbólica que relembra uma antiga tradição da Francomaçonaria.
Dado ao comentado, pela sua origem, é possível se observar que a questão não é de ida e volta da Palavra, mas a de atingir um objetivo e para tanto é preciso simplesmente que ela seja transmitida corretamente.
Infelizmente existe rito que copia essa prática ritualística do escocesismo simbólico atribuindo-lhe uma pretensa liturgia de “ida e volta”. Provavelmente os ritualistas que assim procederam não conheciam a história dessa liturgia e por isso criaram esse retorno contraditório.
Assim, de modo geral se faz cogente compreender que a Palavra Sagrada nessa ocasião não vai, para depois retornar, pois nesse caso ela simboliza uma atitude. Essa é a questão.
Quanto à razão dela aparecer “indo e voltando” no Rito Brasileiro, eu não encontrei nenhuma explicação plausível que possa se coadunar com o verdadeiro sentido dessa tradição.


T.F.A.

PEDRO JUK


MAIO/2018

Um comentário:

  1. Lendo os Rituais do Grau de Apr. do REAA e do RB, ambos em sua versão de 2009, vemos que no primeiro quem encerra a Sessão Ordinária é o 1º Vig., e no RB é o V.M.

    Acredito que estamos falando da mesma alegoria, exatamente como relatado na resposta acima, porém, com uma pequena diferença de interpretação. Não vejo qualquer prejuízo para a liturgia, muito pelo contrário, uma demonstração de que "alguém anda pensando", pois, como sempre ouvi: "Se todos pensam igual, ninguém está pensando."

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