Em 27.05.2024 o Respeitável Irmão Phelipe Gomes,
Loja Jesus Sales de Andrade, 38, GOCE (COMAB), Oriente de Varjota, Estado do
Ceará, apresenta o que segue:
RITO ESCOCÊS ANTIGO E ACEITO
Me comunico com você durante um período de
tempo e gostaria de saber de você sobre quais alterações e "enxertos"
que o REAA sofreu desde o primeiro ritual que chegou aqui através de Francisco
Gê Acayba de Montezuma?
Como, por exemplo, o que o primeiro ritual que
chegou aqui pregava em relação à posição das colunas, se o mestre de cerimônia
fica no lado norte ou sul? Questões como esta.
E outra questão meu irmão, é sobre o iniciado
ter acesso ao oriente, isto realmente existe
desde os princípios, qual forma solucionaria
dele não atingir o oriente hoje.
CONSIDERAÇÕES
Caro Irmão, escrever sobre isto certamente daria uma matéria de muitas
laudas, seguramente até um livro.
Assim, deixo aqui apenas algumas colocações superficiais sobre este tema,
mas que certamente são fatos importantes para o estudo da história do REAA.
Francisco Gê Acayaba de Montezuma, o Visconde de Jequitinhonha, trouxe para
o Brasil, em 1832, o Supremo Conselho do Rito Escocês Antigo e Aceito, uma potência
filosófica que nada tinha a ver com os três graus do simbolismo do REAA. Até
onde eu sei, também não trouxe nenhum ritual, propriamente dito, para os graus
de Aprendiz, Companheiro Mestre.
O primeiro Regulador para os Graus Simbólicos do REAA no GOB somente apareceu
no ano de 1834. Tinha o título de “Guia dos Maçons Escocezes, ou Reguladores
dos Três Gráos Symbolicos do Rito Antigo e Aceito” (grafia da época).
Este regulador copiava basicamente o Guia dos Maçons Escoceses de 1820/21
da França e, como tal, já era bastante influenciado por algumas práticas das Lojas
Capitulares - um sistema criado pelo Grande Oriente da França que existiu
naquela época.
O primeiro ritual (projeto) para o simbolismo do REAA foi criado em
Paris no ano de 1804. Para administrar a construção deste ritual, nascia, em
outubro de 1804, por obra do II Supremo Conselho, uma Loja que ficaria
conhecida como Loja Geral Escocesa (foi extinta em 1816). Desafortunadamente,
este primeiro projeto de ritual acabaria sofrendo indesejáveis intervenções, o
que fez dele um elemento desconfigurado na sua originalidade. Não confundir o
primeiro ritual para simbolismo do REAA (1804) com os cadernos denominados Guia
dos Maçons Escoceses (1820/1821)
Em se tratando do REAA na Maçonaria brasileira, vale ressaltar que a
primeira Loja deste rito no Brasil apareceu no Rio de Janeiro em maio de 1822,
um pouco antes da fundação do GOB em 17 de junho daquele mesmo ano. Sob o título
de Bouclie D’Honneur (Escudo de Honra), não se pode precisar exatamente
como era o ritual do REAA praticado por esta Loja, a não ser que tinha provável
característica capitular.
Por ser de tendência monarquista, a Loja Bouclie D’Honneur não
duraria muito tempo, sobretudo porque naquela época os maçons brasileiros estavam
empenhados em fundar uma obediência genuinamente brasileira, dedicada à lutar
pela causa da Independência do Brasil – certamente as tendências monarquistas
da Loja Bouclie D’Honneur, ligadas à Coroa Portuguesa, não eram nada bem-vindas
no seio da incipiente Maçonaria Tupiniquim.
A segunda Loja do REAA nascida em solo brasileiro foi a Loja Educação e
Moral. Fundada por Joaquim Gonçalves Ledo, ela manteve suas colunas erguidas de
1829 até 1833. Foi instalada por João Paulo dos Santos Barreto, um importante
militar que trazia consigo uma patente do Grande Oriente da França para fundar
Capítulos Rosa-Cruzes.
Isto reforça a possibilidade de que a Loja Educação e Moral, fundada
antes do Supremo Conselho de Montezuma, trabalhava como uma Loja Capitular, isto
é, com os seus 18 graus.
Uma anotação importante sobre a história desta Loja é que ela foi
instalada em uma época em que a Maçonaria se encontrava suspensa no Brasil desde
25 de outubro de 1822 por ordem de D. Pedro I, o Irmão Guatimozim. É de se
ressaltar que o Grande Oriente do Brasil somente seria reinstalado em novembro
de 1831, após a abdicação de D. Pedro I, ocorrida em abril daquele ano. Isto atesta
que mesmo proibida naquela época, a Maçonaria não havia cessado completamente
as suas atividades no Brasil.
Voltando à França do início do século XIX, não menos importante na
história do REEA, é de se destacar que o Rito Francês (ou Moderno) era o principal
rito praticado pelo Grande Oriente da França, a despeito de que sob sua tutela
também existiam outros ritos, como o Adonhiramita e o REAA. Este último, por
exemplo, ainda estava, no primeiro quartel do século XIX (1804), construindo o
seu primeiro ritual para o simbolismo, na Europa.
Sob a tutela do Grande Oriente da França, o primeiro ritual para o
simbolismo do REAA acabou indevidamente recebendo algumas práticas de outro rito.
Por exemplo, no projeto do ritual primitivo do REAA, seu templo não possuía Oriente
separado e elevado. Tal como na Maçonaria anglo-saxônica (Antigos), o piso da
sala da Loja do REAA não possuía desnível.
Também, diferente do Rito Francês (Moderno), as Colunas B∴ e J∴ ficavam no Norte e no Sul, respectivamente; o 2º Vigilante já ocupava
lugar no meridiano do Meio-Dia e o Mestre de Cerimônias sentava-se ao Sul
(Coluna da Beleza), e por aí vai.
No que diz respeito às Lojas Capitulares, as mesmas surgiram por interferência
do Grande Oriente da França no REAA. Naquela época, o II Supremo Conselho do
REAA – o da França – abrigava-se das mesmas dependências do Grande Oriente, em
Paris. Com isso, o Grande Oriente da França, que possuía grande força política
e já tinha sob sua égide o Rito Francês (Moderno) com 7 Graus, dos quais o último
era um grau Rosa-Cruz, logo também se arvorou em tomar para si os 18 primeiros graus
do REAA.
Em linhas gerais, o Grande Oriente alegava que tal como no Rito Moderno,
ele também deveria ser o senhor do Capítulo Rosa-Cruz do escocesismo. Isso fez
com que todos os graus do REAA, abaixo do 18º Grau, ficassem sob a tutoria do
Grande Oriente da França.
Graças à esta alegação, o II Supremo Conselho, o da França, perdia os seus
18 primeiros graus para o Grande Oriente, restando-lhe, apenas, o governo dos
demais graus do sistema escocesista (Kadosh e Consistório).
E assim aparecem as chamadas Lojas Capitulares do REAA no Grande Oriente
da França. Com elas também começam a aparecer as adaptações e alterações significativas
no primeiro ritual para o simbolismo do REAA. Dentre estas, uma muito importante
neste arrazoado, foi a criação de um santuário Rosa-Cruz para atender ao
Capítulo, o qual passou a ocupar todo o Oriente da Loja. Com isso, o Oriente, que
antes ficava no mesmo nível do Ocidente, passou a ficar mais alto, ou seja, elevado
por um degrau e separado por uma balaustrada.
Diferente do Rito Moderno, que já possuía o Oriente elevado, não por um,
mas por quatro degraus, no REAA esse desnível era de apenas um degrau.
Um aspecto importante para este Oriente elevado na Loja Capitular era o
de que nele só podiam ingressar Irmãos do Capítulo. Neste sistema, o Athersata
- governador do Capítulo - era também o Venerável Mestre das simbolismo. Aprendizes,
Companheiros e Mestres só podiam transitar pelo Ocidente da Loja.
Vale ressaltar que primitivamente no REAA os juramentos eram prestados sobre
o Altar do Venerável Mestre. Aliás, inicialmente nem mesmo havia leitura de qualquer
trecho do Livro da Lei.
Graças à separação entre o Oriente e o Ocidente para atender ao
santuário Rosa-Cruz, houve-se por bem criar uma extensão do altar principal, motivo
pelo qual veio aparecer uma pequena mobília movediça, chamada de Altar dos Juramentos.
Esta peça ficava no Oriente em frente ao altar principal e podia atender a
prestação dos juramentos, tanto os do capítulo, como do simbolismo. Devido a
sua mobilidade, o Altar dos Juramentos era convenientemente arrastado até a divisa
com o Ocidente para atender aos juramentos das Lojas de São João (simbolismo).
Mais tarde, com a extinção total das Lojas Capitulares, os graus de
Aprendiz, Companheiro e Mestre do REAA permaneceram sob a tutela do Grande
Oriente da França, enquanto que os demais graus, do 4º em diante, retornavam para
o II Supremo Conselho.
Mesmo colocadas as coisas nos seus devidos lugares, não a dúvida que as
Lojas Capitulares deixaram marcas profundas nos rituais do simbolismo do REAA,
das quais uma delas foi a permanência do Oriente elevado e separado nas Lojas simbólicas.
Assim, com o Oriente permanecendo elevado e separado nos templos das
Lojas simbólicas do escocesismo, o quadrante oriental agora passou a ser lugar
restrito dos Mestres Maçons, Mestres Instalados e Autoridades do simbolismo.
Nessa conjuntura, o Altar dos Juramentos também se consagrou permanecendo fixo no
centro do Oriente, em frente ao Altar principal.
Devido à permanência do Altar dos Juramentos no Oriente, separado do Altar
do Venerável Mestre, convencionou-se que no REAA, durante a cerimônia de Iniciação
e Elevação, Aprendizes e Companheiros que estiverem sendo iniciados, ou elevados,
podem ingressar no Oriente, porém exclusivamente para atender às passagens
iniciáticas previstas no ritual. Fora disso, sob nenhuma justificativa Aprendizes
e Companheiros podem ingressar no Oriente em Loja aberta.
Então, estes são os apontamentos para a sua questão. Ao concluí-los,
reitero que no REAA o lugar consagrado do Mestre de Cerimônias é na Coluna do
Sul; as Colunas B∴ e J∴ são vestibulares, portanto ficam no átrio, B∴ à esquerda de quem entra e J∴ à direita; o Oriente fica apenas um
degrau mais alto do que o Ocidente; o 2º Vigilante, diferente dos demais ritos
franceses, fica no meridiano do Meio-Dia; o Altar dos Juramentos é um pequeno
móvel situado no Oriente em frente ao Altar ocupado pelo Venerável Mestre.
No fim, vale destacar que rituais escoceses contemporâneos das Lojas
Capitulares sofreram muitas interferências destas. Houve muitas acomodações e
adaptações que não condizem com o que havia sido proposto no primeiro ritual, o
de 1804. Por forças circunstanciais, o Guia dos Maçons Escoceses (França) e
ritual de 1834 (Brasil), de 1829 (França) dentre outros daquela época, são
parte dessa história. Cabe ao autêntico historiador examinar e separar o que é
falso e o que é verdadeiro.
T.F.A.
PEDRO JUK – SGOR/GOB
jukirm@hotmail.com
http://pedro-juk.blogspot.com.br
JAN/2024