Em 13/04/2017 o Respeitável Irmão
Lauro Goerll Filho, Loja Filhos do Pelicano, REAA, GOB-PR, Oriente de Cianorte,
Estado do Paraná, solicita os seguintes esclarecimentos através do meu blog http://pedro-juk.webnode.com/
FILHOS DA VIÚVA E ARTE REAL
Tenho, no momento duas dúvidas: O porquê de os
maçons serem chamados de "Filhos da Viúva". E da referencia à
Maçonaria como Arte Real.
CONSIDERAÇÕES:
Filhos da Viúva. A
principal explicação para o uso dessa expressão com a qual também se denominam
os maçons é a de que ela se relaciona inteiramente com a Lenda do Terceiro Grau
(Lenda de Hiran Abif, ou Hiran, meu pai).
Essa Lenda, além da
sua relação com a fábula Noaquita (Noé e os seus três filhos), é também
largamente baseada na lenda de Osíris que, por sua vez é haurida dos cultos solares
da antiguidade (ver essa Lenda no Antigo Egito).
Na concepção maçônica da
Lenda Hirâmica, Hiran é tido como o arquiteto e hábil decorador do Templo,
sendo ele filho de uma viúva da Tribo Neftali.
Na realidade essa
relação emblemática da Lenda é “solar” e é tida como a representação da morte e
da ressurreição da Natureza. Em síntese ela procura representar de modo velado
por símbolos e alegorias que a mãe Terra fica viúva do Sol uma vez por ano, ou
seja, durante o ciclo do inverno quando a escuridão prevalece sobre a luz –
dias curtos e noites longas conforme o hemisfério.
Assim a Terra é a “viúva”
e o maçom simbolicamente o seu “filho”. Explica-se: na lenda maçônica, Hiran é
a alegoria do Sol que morre para renascer na primavera revivendo a Natureza
purificada (o fogo renova a Natureza inteira – concepção mitráica).
É adequado o
entendimento de que o ciclo da vida humana na Terra se dá de modo análogo à
divisão dos ciclos naturais – infância (primavera), juventude (verão),
maturidade (outono) e morte (inverno). Essa concepção tida como deísta fica bem
latente na vertente latina da Maçonaria como é o caso do REAA. Note que nesse
Rito, os ciclos naturais, que servem como exemplos relativos à existência
humana, são representados, sobretudo, pelas doze Colunas Zodiacais, cujas suas
localizações na Loja, ladeando o canteiro de trabalho no topo da Coluna do Norte
e do Sul, se iniciam na constelação de Áries (começo da primavera no Norte –
ressurreição) e segue seu ciclo até Peixes (ainda o inverno no Norte – morte da
Natureza), destacando-se que a referência Norte é para o hemisfério Norte do nosso
Planeta por ter sido nele onde nasceu a Maçonaria, objeto desse estudo.
Sinteticamente essa é
a senda iniciática que o maçom percorre como Aprendiz, Companheiro e Mestre e relacionado
diretamente a essa alegoria, estão as Luzes dos candelabros de três braços adotadas
em alguns ritos que, na sua plenitude, estarão com todas as nove luzes acesas, no
entanto ainda ficam faltando três Luzes para perfazer o ciclo natural completo
que é doze (doze são os meses do ano). Na realidade essa falta das três Luzes é
proposital, pois as suas ausências se referem justamente ao inverno quando a
Terra fica “viúva” da Luz.
Assim, o maçom ao ser
exaltado (ou elevado conforme prevê a vertente inglesa de Maçonaria) ao
Terceiro Grau, e por ter sido ele o personagem principal desse teatro simbólico,
acabou sendo então identificado como “Filho da Viúva” – Filho da Terra.
Como identidade o termo “Filho da Viúva” é
generalizado e não depende dessa ou daquela vertente maçônica (francesa ou
inglesa), pois nos sistemas cujos ritos e trabalhos não possuem simbologia e
alegoria análoga à mencionada do REEA, a identificação mesmo assim se dá por
ter sido Hiran, segundo a Lenda, também o “Filho de uma Viúva da Tribo
Neftali”.
A Arte Real. Essa
é uma expressão que pode ser perscrutada sob dois aspectos. Uma como aquela
ligada às Corporações de Ofício medievais e a outra sob o ponto de vista do
misticismo alquímico que ingressou na Ordem especulativa a partir do século
XVIII.
Sob o ponto de vista
histórico, as Corporações de Ofício (operativo) quando das Associações
Monásticas, Confrarias Leigas e a Francomaçonaria, além delas serem
subordinadas à Igreja, adquiriram muitos hábitos dos antigos construtores
anteriores à Maçonaria, a exemplo dos Collegiati
que pertenceram à primeira associação de ofício organizada denominada Collegia Fabrorum à época do imperador
romano Numa Pompílio no século VI a. C., cuja organização iria perdurar até a
Idade Média. Na realidade esses construtores tinham a missão de reconstruir o
que a atividade bélica ia destruindo nas conquistas romanas pela Europa.
Historicamente, graças
a essa especial organização e subordinação que se seguiriam até os reinados da
época medieval é que a Maçonaria de Ofício, composta por artífices medievais
(canteiros), acabaria sendo também conhecida pelo título de Arte Real, título
esse que seria estendido à Maçonaria Especulativa e por fim até a nossa Moderna
Maçonaria. O termo Real, como adjetivo, se refere ao que pertence ou é relativo
ao rei ou à realeza; régio, já que a Maçonaria, além do amparo da Igreja, viria
viver um bom período também sob a proteção de reis e reinados.
Como segunda definição
desse título dado à Maçonaria, a Arte Real sob o ponto de vista da alquimia,
ficou conhecida como a Grande Obra, ou a Obra do Sol também denominada sob essa
óptica como Arte Real. Na realidade essa “arte” se propunha a transformar o vil
metal em ouro pela purificação dos elementos. A alquimia, mãe da química, teve
uma grande propagação na época e tratava, no seu sentido experimental, de
utilizar as forças da Natureza procurando com isso dar aos seus iniciados a
ideia de um mistério profundo na busca de um solvente universal (menstruum universale), cujo corolário
desse conhecimento ficaria conhecido como a verdadeira pedra filosofal. Para o grande alquimista do século XVI, Aurelius
Filipus Teophrastus Bombastus Von Honenheim, conhecido como Paracelso, a
alquimia era uma ciência a transmutar os metais uns em outros, o que se resumia
em procurar transformar as imperfeições dos metais em ouro. Nesse mesmo sentido
a prática alquímica também buscava pelo elixir da longa vida como uma espécie
de panaceia universal que se propunha curar todos os males naturais dos homens.
Entretanto, pensadores
adeptos do misticismo e do ocultismo, através da alquimia mística, desprezavam
o ouro material preocupando-se apenas com o “ouro espiritual”, por isso,
transcendental. Assim, todos os esforços da alquimia mística e oculta,
contrários à alquimia prática, eram dirigidos à transmutação do quaternário
inferior humano (quadrado) ao ternário divino (triângulo), de tal modo a
alcançar a totalidade cósmica (círculo). Os quatro elementos materiais de então,
Terra, Ar, Água e Fogo, eram comparados na alquimia mística aos planos,
espiritual, mental, psíquico e físico da natureza humana.
Nesse sentido, a Moderna
Maçonaria influenciada por pensadores adeptos dessa alquimia, em alguns dos
seus ritos, acabou recebendo muitas práticas simbólicas que nela ingressaram a
partir do século XVIII, tanto no sentido da alquimia prática como no da mística.
É o caso, por exemplo, do REAA com a representação dos “quatro elementos da
antiguidade” (terra, ar, água e fogo), presentes inclusive nas suas viagens
iniciáticas e na Câmara de Reflexão onde se apresentam símbolos como o do
enxofre, do mercúrio, do sal, etc.
Na realidade a Maçonaria
não trata de ocultismo e nem propõe a prática da alquimia, porém desenvolveu
através dos seus símbolos uma alegoria destinada a sugerir a transformação e
aprimoramento do Homem, cujas características lhe deram o nome de Grande Obra,
ou Obra do Sol ou ainda de Arte Real, identificando, evidentemente, o
Sol à Luz da Verdade e do Conhecimento.
A ideia especulativa na Maçonaria de transformar o
Homem num elemento capaz de construir um Templo à Virtude Universal se coaduna
com a sua prática iniciática, a despeito de que é por ela que se tem buscado
incessantemente o aperfeiçoamento do maçom.
Dadas essas considerações, são esses os
significados que dão ao maçom o título de Filho da Viúva e para a Maçonaria o
de Arte Real.
É oportuno por fim
comentar que a Moderna Maçonaria é uma Instituição que ordena os seus objetivos
através de um sistema particular velado por símbolos e alegorias. Assim, no que
diz respeito ao significado da expressão “Filho da Viúva” abordada na primeira
parte desse arrazoado e nela a menção de Lendas que se remetiam ao antigo Egito
como a de Osíris, assim como outras mencionadas, em nenhuma hipótese elas se
deram para afirmar existência de Maçonaria naqueles tempos remotos. Elas foram
comentadas apenas para sugerir o arquétipo de uma lenda que a Moderna Maçonaria
criou para montar o arcabouço doutrinário do Terceiro Grau. Do mesmo modo quando,
a título de esclarecimento, foi feita referência ao termo “Arte Real”
relacionado ao Imperador e aos Collegia
Fabrorum nascidos no século VI a. C. – isso também não afirma existência de
Maçonaria naquela época.
Na verdade essas
referências foram feitas apenas com o objetivo singular de demonstrar alguns
pormenores que envolveram a criação e a evolução do arcabouço doutrinário da
Maçonaria. É sabido, reitero, que autenticamente a Sublime Instituição possui
documentalmente apenas aproximados 800 anos de história.
Do mesmo modo ocorreu
nesse escrito quando fora feita menção à arte da alquimia, porquanto a mesma
teve apenas o caráter elucidativo de o porquê da existência de algumas
alegorias maçônicas a ela relacionadas. Com isso, afirma-se que a Maçonaria não
é alquimista e nem mesmo a exercita, muito menos sugere qualquer aprendizado ocultista.
É mister compreender
que os símbolos e as alegorias maçônicas compõem a espinha dorsal de uma Ordem que
tem como um dos seus objetivos principais prestar ensinamentos éticos, morais e
sociológicos aos “Filhos da Viúva” que praticam a “Arte Real”.
T.F.A.
PEDRO JUK
MAIO/2017