quinta-feira, 9 de agosto de 2018

PRIMEIROS RITUAIS MAÇÔNICOS - INÍCIO DA RITUALÍSTICA


Em 26/05/2018 o Respeitável Irmão Nilson Alves Garcia, Deputado Federal da Loja Estrela da Serrinha, REAA, GOB-GO, Oriente de Goiânia, Estado de Goiás, apresenta a seguinte questão:

PRIMEITOS RITUAIS


Irmão Pedro, gostaria de um comentário a respeito dos primeiros rituais maçônicos. Quando começou a ritualística maçônica?

CONSIDERAÇÕES

Esse não é um assunto que pode ser tratado como laudatório e nem mesmo sintetizado numa breve resposta como essa, até porque a história da Maçonaria compreende um mosaico de fatos e acontecimentos que de tempos em tempos, atendendo a pesquisa acadêmica séria e sem invenções, vem sendo paulatinamente trazidos à luz.
A ritualística que conhecemos atualmente, sobretudo nas nossas Obediências, é oriunda de rituais pertinentes aos ritos praticados, sabendo-se que esses, ao longo dos tempos vêm sofrendo inúmeras influências, enxertos e mutações. Em síntese, uma ritualística descaracterizada maçônicamente por uma liturgia criada ao sabor da estúpida quantidade de rituais impressos.
Assim, falar em ritualística e como ela começou, por primeiro é preciso se destacar o rito a que ela pertence, bem como a sua origem cultural e histórica. Nessa empreitada não há como se confundir os atuais rituais como uma descrição fiel dos antigos catecismos que serviram de base para estruturar as diversas liturgias conhecidas.
Outro aspecto é o de se desvincular da fantasia que equivocadamente atribui à Maçonaria uma pretensa antiguidade, tal como fosse ela oriunda dos tempos do Antigo Testamento. Ora, Isso não existe, para tanto o pesquisador, se desvencilhado dessas afirmativas temerárias, há de compreender que verdadeiramente a Maçonaria, longe do falso caráter de existência milenar, possui sim aproximados oitocentos anos de história.
Ao longo da sua existência a Maçonaria passou pelo período Operativo, ou de Ofício, cuja documentação mais antiga que menciona Lojas da Francomaçonaria está no Poema Régius datado de 1390 (século XIV). A seguir, a sua marca Especulativa, ou a dos Aceitos, ocorrida pelo declínio das antigas corporações medievais de construtores, apareceria no ano de 1600 (século XVII) com o ingresso do primeiro elemento estranho à profissão, o latifundiário escocês John Boswel, iniciado como “maçom aceito” na Loja Capela de Maria em Edimburgo na Escócia. Daí, passando por esse período de transição iniciado em 1600, no ano 1717 aparece a Moderna Maçonaria que fora estabelecida com a fundação da Primeira Grande Loja em Londres, oportunidade em que fora inaugurado o primeiro sistema obediencial com o aparecimento da figura do Grão-Mestre. A Moderna Maçonaria tem a partir daí em suas Lojas a esmagadora maioria de maçons aceitos, o que em breve se tornaria a sua marca pelo desaparecimento por completo das Lojas Operativas.
Cabe ainda um comentário. Quando vinculamos a documentação mais antiga relacionada à Maçonaria no século XIV, é porque só a partir daí esse título começa a aparecer, - então denominado como a Francomaçonaria. Por óbvio que desde o século X encontramos registros pertinentes às corporações de ofício, porém ainda como antecedentes da Maçonaria, das quais podemos citar as Associações Monásticas e as Confrarias Leigas, cujas guildas desde o século X utilizavam a palavra Loja para as organizações de ofício (pedreiros, carpinteiros, sapateiros, etc.).
Assim, a divisão histórica da Maçonaria mais aceita por pesquisadores autênticos segue a ordem começando pela Maçonaria Operativa, ou de Ofício, seguida da Maçonaria dos Aceitos, ou Especulativa e por fim a Moderna Maçonaria (especulativa por excelência) com o sistema obediencial tal como conhecemos atualmente.
Em se tratando de ritualística maçônica, é justamente no período Especulativo que documentalmente aparecem os primeiros arremedos de rituais e a posteriori, já no século XVIII, o aparecimento dos ritos maçônicos.
Como o assunto é amplo, seria desproposital abordá-lo por completo num pequeno arrazoado como esse, entretanto como um pequeno resumo vou citar o respeitadíssimo e autêntico autor Harry Carr que atuou como secretário da Quatuor Coronati Lodge, 2.076 e autor de inúmeras obras maçônicas, dentre as quais o seu irretocável Manson’s at Work. Carr, indubitavelmente foi um Irmão historiador preocupado com a autenticidade e que fez um dos mais minuciosos estudos sobre os primeiros catecismos e rituais na história da Sublime Instituição.
Seguindo o desempenho do Irmão Harry Carr quando se refere ao mais antigo ritual para os dois graus (só existiam dois na época), ele menciona, em outra obra sua intitulada “Seiscentos Anos de Ritual”, um documento datado de 1696. Assim, comenta o referido autor:
“A mais antiga prova que temos, é um documento datado de 1696, belamente escrito à mão e conhecido como Edinburgh Register House Manuscript, por que foi achado no Escritório de Registros Públicos de Edinburgh (Public Record Office of Edinburgh). (...) tem o título de A FORMA DE TRANSMITIR A PALAVRA MAÇONICA que é um modo de dizer que é a maneira de se iniciar um maçom. Começa com a cerimônia que faz do aprendiz um <aprendiz iniciado> (geralmente três anos depois do começo de seu contrato), seguida pela cerimônia para admissão do <companheiro da ordem>, o título do segundo grau. Os detalhes são fascinantes ...”
Destaque-se assim o ano de 1696 (século XVII) para o registro de uma “forma de transmitir a palavra” como comentário de ritualística maçônica.
Ainda o mesmo autor trata do assunto quando faz um exame sobre a obra de outro autor autêntico e não menos importante - Irmão Douglas Knoop - denominada The Early Masonic Catechisms.
Harry Carr em 25 de novembro de 1946 comentando essa obra escreve para a Loja de Pesquisas de Leicester, 2429, o arrazoado An Examination of the Early Masonic Catechisms. Na página 05 desses comentários ele ordena 16 catecismos básicos para esse estudo tendo por período os anos de 1696 até 1730.
Segue abaixo o registro dessa descrição que tem servido como base sequencial para o aparecimento da ritualística maçônica:
TÍTULO/TIPO
DATA
The Edimburg Register House – Manuscrito
1696
The Chetwod Ceawley – Manuscrito
cerca de 1700
The Sloane – Manuscrito, 3329
cerca de 1710
The Dumfries Nº 4 - Manuscrito
cerca de 1710
The Trinity College Dublin - Manuscrito
1711
A Mason’s Examination – Flying Post Newspaper
1723
The Grand Mistery of Free-Masons Discover’d - Panfleto
1724
The Whole Institution of Masonry - Manuscrito
1724
Institution of Free-Masons - Manuscrito
cerca de 1725
The Whole Institution of Free-Masons Opened
1725
The Graham - Manuscrito
1726
The Grand Mistery Laid Open
1726
A Mason’s Confession – Revista Escocesa
1727
The Wilkinsons - Manuscrito
1727
The Mistery of Free-Masonry – Daily Journal - Jornal
1730
Prichard Masonry Dissected - Panfletos
1730
Assim, essa lista ordena manuscritos, obras espúrias e revelações relativas a alguma coisa que se ligue à ritualística maçônica. Nesse sentido, os manuscritos mencionavam as formas antigas de trabalhar como um arremedo das primeiras práticas, enquanto que as obras espúrias e as revelações, embora reprováveis sob o ponto de vista da “traição” porque revelavam as práticas maçônicas em panfletos e jornais da época, acabaram servindo mais tarde para que os historiadores pudessem compreender como eram os trabalhos daquela época.
Compreenda-se, entretanto que essas revelações e manuscritos não traziam ainda a prática litúrgica relativa a um rito maçônico, até porque os ritos só começariam a aparecer no século XVIII, principalmente. Porém é bastante provável que esses catecismos e revelações tenham dado muito suporte para a elaboração dos rituais e suas respectivas ritualísticas que apareceriam em seguida.
A despeito desses comentários eu, como outros autores brasileiros, a exemplo de José Castellani, Francisco de Assis Carvalho, Theobaldo Varolli Filho, prefiro seguir a compreensão sobre o tema como a que faz o Irmão Harry Carr e Douglas Knoop, sobretudo porque esses possuem conceitos fundamentados em documentação primária. Com isso entendo que a ritualística maçônica especulativa começou a tomar forma a partir do ano de 1696 conforme menciona o manuscrito The Edimburg Register House.
Nesse sentido, sugiro para o aprofundamento da sua questão o estudo das obras dos autores mencionadas no texto, além de outras referências bibliográficas a respeito que podem ser encontradas na Quatuor Coronati Lodge 2076 de Londres (Loja de Pesquisas mais antiga do mundo).
Concluindo, devo alertar que esse estudo é longo e não se pode acreditar serem eles encontrados em rituais tais quais como os conhecemos na atualidade. Entenda-se que com o passar dos tempos as Obediências Maçônicas acabaram adotando práticas particulares sobre os costumes autênticos dos ritos praticados, costumes esses que nunca fizeram parte da verdadeira Maçonaria. Para que se possa ter um bom entendimento da situação, o pesquisador deve separar o joio do trigo, isto é, saber o que é liturgia do rito e o que é um procedimento protocolar criado para satisfazer situações, sobretudo quando falamos de autoridades, cargos, condecorações, ocupação de lugares, ordem de precedência, etc. A verdadeira liturgia maçônica está severamente comprometida com os ensinamentos esotéricos a que o rito se propõe e nunca como um desfile de futilidades.

T.F.A.

PEDRO JUK

AGO/2018

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