terça-feira, 11 de fevereiro de 2020

DECORAÇÃO E SIMBOLOGIA EGÍPCIA NOS TEMPLOS MAÇÔNICOS


Em 20/11/2019 o Respeitável Irmão Roberto Ney Lusvarghi, Loja Luz e Progresso, 189, REAA, GLMMG, Oriente de Araxá, Estado de Minas Gerais, apresenta o que segue:

SIMBOLOGIA EGÍPCIA NOS TEMPLOS MAÇÔNICOS


Tenho buscado, sem sucesso, a representatividade da simbologia egípcia nos Templos Maçônicos.
Gostaria de saber se o Ir.´. já tem estudado esse assunto, se tem algum trabalho publicado ou se pode me indicar literatura a respeito.
Muito obrigado pela sua atenção e receba os meus parabéns pela sua imensa dedicação aos estudos de nossa Ordem.

CONSIDERAÇÕES.

Os comentários que se seguem abordam o tema num sentido amplo e não específico a apenas um símbolo.
Não resta dúvida que o costume de utilizar desmedidamente agregados simbólicos penitentes à cultura egípcia se tem feito presente na decoração de muitos templos maçônicos pelo mundo. Todavia isso se dá mais por efeito decorativo do que iniciático, pois a história autêntica já comprovou inúmeras vezes a inexistência da Ordem Maçônica nos tempos do Antigo Egito.
É bem verdade que houve inclusive personagens embusteiros que criaram ritos maçônicos exaltando uma suposta maçonaria egípcia (Memphis-Misraim), mas que mais tarde foram desmascarados por fraude – dentre outros a respeito, vide apontamentos sobre in Dictionnaire des Franc-Maçons et de la Franc-Maçonerrie, Alec Mellor, Belfond, Paris, 1971-1979.
Sob o aspecto da Maçonaria documental (autêntica), a Sublime Ordem comprovadamente possui aproximados 800 anos de história, sendo os seus ancestrais as guildas de construtores da Idade Média. Assim, a Instituição Maçônica não nasceu e nunca existiu nos tempos do Egito Antigo, portanto é preciso antes compreender que para construção do seu arcabouço doutrinário especulativo muitas lendas passariam a fazer parte nesse contexto. Contudo, reafirma-se que são lendas introduzidas com o desiderato de, como alegorias, aplicar lições de moral, ética e sociabilidade e não como elementos comprobatórios relacionados à existência verdadeira de fatos e acontecimentos ao ponto de aparecerem decorando paredes de templos maçônicos.
Assim compreendido, cita-se por exemplo a Lenda do 3º Grau como parte desse arcabouço lendário que fora retirado dos cultos solares da Antiguidade, cujo qual, por esse viés, possui palpável consonância com a lenda de Osíris, Ísis e Hórus, entretanto esse não é um fato histórico, mas lendário, assim não autoriza qualquer afirmativa no sentido de que lendas da antiguidade usadas pela Maçonaria sirvam para comprovar sua existência naqueles idos tempos – muito menos arrumar justificativas para se construir templos maçônicos copiando arquitetura egípcia.
Lendas são lendas e não afiançam autenticidade aos fatos que constituem o mosaico da História. Infelizmente essa não é uma lição que tenha sido aprendida por muitos imaginosos autores que, em detrimento de citações lendárias associadas ao ufanismo maçônico, semeiam suposições que não têm qualquer compromisso com a verdade. James Anderson, por exemplo, carregou algumas páginas da Constituição de 1723 com essas elucubrações, geralmente retiradas do Old Charges que traziam forte apelo religioso, especialmente pela forte influência da Igreja sobre as corporações de ofício da Idade Média. Sob o aspecto prático, é compreensível que Anderson tenha inserido essas exposições lendárias já que a "nova ordem", amparada pela Royal Society e que compunha a Moderna Maçonaria, surgida em 1717 em Londres, carecia de agregar novos adeptos e com isso chamar atenção com fatos tidos como "misteriosos segredos guardados pela Maçonaria". Isso sem dúvida ajudou a Premier Grand Lodge reforçar suas Colunas, principalmente com membros atraídos pela curiosidade despertada, sobretudo quando publicados nos diários londrinos da época. Lawrence Dermott, por exemplo, para atrair adeptos para a sua Grande Loja, a dos Antigos (1751), criou o Real Arco afirmando que nele havia o encerramento e a explicação da Lenda do 3º Grau. Artifício inteligente que até hoje faz com que adeptos da Ordem acreditem na existência de um 4º grau maçônico advindo dos tempos imemoriais, fato que também não se sustenta, pois comprovadamente a Maçonaria de antanho trabalhava com apenas duas classes de trabalhadores, vindo a surgir o 3º Grau especulativo somente na Moderna Maçonaria surgida no final do primeiro quartel do século XVIII.
Outro aspecto nesse mesmo sentido (o da não existência de Maçonaria na antiguidade) é o que envolve a própria "arte de construir".
Nesse sentido, não há como negar que a profissão de construtor é um ofício milenar, entretanto não como uma organização feito à Maçonaria.
A arte de construir, surgida principalmente pela necessidade de se proteger, fez com que o homem, ao deixar a vida sedentária das cavernas para viver em sociedade estratificada, começasse a edificar choupanas, vivendas e casebres para se abrigar das intempéries e se proteger dos perigos e agruras comuns ao ambiente que o envolvia.
Com isso davam-se os primeiros passos na arte e no ofício das construções, sendo, portanto, perfeitamente viável se afirmar que essa profissão é oriunda dos tempos imemoriais, entretanto isso não significa dizer que existiam guildas de construtores maçons naquela época, pois documentalmente se sabe que a Franco-Maçonaria somente viria florescer, sob a proteção da Igreja-Estado, no século XIII.
Como sociedade organizada de artesãos construtores, a Franco-Maçonaria, seguindo o curso da história e atendendo à necessidade surgida pela expansão dos domínios da Igreja, nascera em substituição, primeiro às Associações Monásticas e depois às Confrarias Leigas
Longe e anterior a tudo isso está a civilização do Antigo Egito ocorrida no Antigo Oriente próximo ao norte da África há 3.100 a. C. Seu aparecimento no ideário maçônico, além daqueles motivados por lendas solares, provavelmente se reforçou por teorias de incautos e ufanistas que, usando da lei do menor esforço, não tardariam a imaginar as pirâmides sendo construídas por maçons, o que cientificamente é muito pouco provável, simplesmente porque não existe nenhuma prova ou indício que aponte para a existência da Maçonaria naquele período.
Saindo do Antigo Egito, mas seguindo esse mesmo viés, vem a construção do primeiro templo hebraico, o de Jerusalém, muito conhecido em Maçonaria como Templo de Salomão (o rei que reinou em Israel de 1010 a 970 a.C.).
Por ser a maior alegoria maçônica e ligado à lenda hirâmica, a construção desse Templo também não tardaria a despertar no fértil imaginário que foram os maçons os seus construtores, tudo obviamente em detrimento à Lenda do Terceiro Grau onde os personagens do Rei Salomão, Hiram - Rei de Tiro e Hiram Abif (Hiram meu Pai), de modo fictício, são descritos mitologicamente como maçons no sentido de estruturar a lenda introduzida em 1725 pelo aparecimento do grau de Mestre Maçom na Moderna Maçonaria.
Na realidade, a Lenda do Terceiro Grau é a adaptação de uma lenda Noaquita que envolve os personagens bíblicos de Noé e seus três filhos, Sem, Can e Jafé. Sem dúvida essa lenda, tal como a de Osíris, Ísis e Hórus, se estrutura nos cultos solares da Antiguidade, cujos quais serviram de base para a maioria das religiões que conhecemos.
Retomando a Lenda Hirâmica, ela, como qualquer outra lenda, não tem qualquer compromisso com a realidade histórica, portanto ela não afirma, mas apenas menciona figuradamente a Maçonaria na época da construção do primeiro templo hebraico - o de Jerusalém.
Infelizmente isso ainda não tem sido bem compreendido e faz com que muitos maçons não separem lenda - que é uma narrativa escrita ou oral no qual fatos históricos são deformados pela imaginação - de realidade histórica. Com isso, acabam muitos, até de modo infantil, disseminando inverdades tal como a de "achar", por exemplo, que os templos maçônicos são edificados como cópias fiéis do lendário templo bíblico.
Embora alguns ritos maçônicos, por questões doutrinárias decorem seus templos estilizando mobiliários e partes do espaço de trabalho, relativizando-os às descrições imaginadas do lendário templo hebraico, por certo isso só pode ser tratado como característica de uma alegoria maçônica construída sob elementos figurados. Entenda-se que a sala da Loja, como uma oficina simbólica de trabalho, longe está de ser um modelo (arquétipo) do Templo de Jerusalém.
Não é cabível, portanto, que ainda existam maçons que não saibam discernir narrativas lendárias de fatos reais e continuem imaginando que foram os maçons os construtores do Templo de Jerusalém, ou mesmo os que construíram as Pirâmides do Egito.
Sem conclusões apressadas é mister mencionar que o primeiro templo maçônico somente viria surgir nos meados do século XVIII na Inglaterra após o advento do aparecimento da Moderna Maçonaria. Assim, sua disposição mobiliária copia a do Parlamento Britânico, principalmente no que diz respeito à acomodação do plenário e da great chair. No mais, por influência da Igreja sobre os ancestrais da Moderna Maçonaria, os templos maçônicos seguem o mesmo modelo de orientação das Igrejas, destacando que, por sua vez, essas últimas foram inspiradas no Tabernáculo hebraico, antepassado do Templo de Jerusalém.
Dado ao exposto, a Maçonaria deve ter seus templos decorados conforme o previsto no rito que a Loja pratica, não obstante existirem às vezes, em total desrespeito para com a originalidade e liturgia, muitos elementos decorativos que apenas possuem o desiderato de satisfazer o gosto e a imaginação de alguns.
Certo é que como exemplificado anteriormente, elementos decorativos tais como painéis pertinentes ao Antigo Egito, ou outros do gênero, não fazem nenhum sentido para o REAA, dentre outros, embora, como dito, eles equivocadamente muitas vezes apareçam no interior de alguns templos maçônicos.
Eu diria que essa decoração é mais apropriada para a AMORC (Antiga e Mística Ordem Rosa Cruz) do que para a Maçonaria. Como elementos associativos eles até podem aparecer no contexto das lendas, mas muito longe de se materializarem como símbolos aplicados pela doutrina maçônica.
É daí meu Irmão talvez o seu insucesso na procura de explicações sobre a simbologia egípcia na decoração dos templos maçônicos.
Em termos de decoração egípcia nos templos simbólicos do REAA, por exemplo, podem existir elementos pontuais, como é o caso, por exemplo, da decoração original das Colunas B e J. Essas, de estilo babilônico, comumente aparecerem decoradas com folhas de lótus (universalidade) e de papiros (eterna busca pelo transcendental). Explicam-se as suas presenças porque as Colunas Gêmeas são pilares solsticiais, portanto se relacionam diretamente com os cultos solares da Antiguidade. Assim, as folhas de lótus e papiros (símbolos egípcios), de modo pontual, remontam ao significado de uma alegoria reservada aos iniciados, porém nunca para mencionar a existência da Maçonaria nos tempos do Antigo Egito.
Cada símbolo traz consigo a sua originalidade, a despeito de que em Maçonaria ele geralmente aparece para chamar atenção do iniciado para uma verdade inserida numa mensagem oculta (esotérica).
Desse modo, outros elementos simbólicos pertencente às diversas civilizações também fazem parte de corolário emblemático maçônico, contudo eles não possuem o desiderato de explicar a presença da Ordem em períodos da História.
Concluindo, a simbologia maçônica é ampla e abrange inúmeros aspectos culturais e sociológicos que foram retirados do misticismo de muitas civilizações. A Ordem Maçônica, eclética por natureza, para montar seu arcabouço doutrinário se utilizou desse artifício. Cabe assim ao maçom entender que a simples presença de símbolos de antigas civilizações no corolário simbólico adotado pela Maçonaria não representa que a Ordem possui caráter de existência milenar. Reitero, documentalmente a Maçonaria possui aproximados 800 anos de história, o resto... Bem, o resto é lenda.



T.F.A.


PEDRO JUK


FEV/2020

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