Em 26.12.2022 o Respeitável Irmão Luís Filipe Torres Conceição, Loja Fraternidade Ferrense, REAA, GOB-MG, Oriente de São Pedro dos Ferros, Estado de Minas Gerais, apresenta o que segue:
A COLCHA DE RETALHOS
Se pudesse fazer uma lista das alterações mais
bizarras e sem sentidos feitas durante aos longos dos anos no REAA, quais
seriam?
CONSIDERAÇÕES.
Inicialmente é preciso dizer que as coisas
não são tão simples assim, principalmente pelo modus operandi latino de
editar uma enorme quantidade de rituais no curso do tempo. Escolher o certo e o
errado entre tantos, não é tarefa das mais fáceis.
De certo modo, para compreender a
originalidade dos rituais simbólicos do REAA é preciso antes conhecer a saga da
construção do seu primeiro ritual no início do século XIX (1804) na França.
Escocesa, criada em outubro de 1804 na cidade de Paris para gerenciar a construção do 1º Ritual.
Não obstante esses elementos históricos e
estruturais, considere-se ainda nessa conjuntura a criação das Lojas
Capitulares pelo Grande Oriente da França que, a partir de 1816, começaria a
fazer estragos no primitivo projeto do ritual de 1804 do REAA.
Relacionado às Lojas Capitulares está o Guia
dos Maçons Escoceses, então implantado na França aproximadamente entre 1821/22.
Esse guia, que na verdade não era propriamente um ritual, influenciou em
demasia os trabalhos do simbolismo. Um exemplo disso foi a criação do Oriente
da Loja elevado e demarcado para atender a necessidade de se acolher o Santuário
Rosa Cruz onde seriam acomodados na Loja os portadores dos graus capitulares
escoceses. Nessa época, o Athersata do Capítulo (Grau 18) era também o Venerável
Mestre da Loja Simbólica. É preciso conhecer esta história.
Posso dizer que já escrevi bastante a respeito
e esses produtos escritos podem ser encontrados no Blog do Pedro Juk hospedado
em http://pedro-juk.blogspot.com.br
No contexto do primeiro ritual, vale mencionar
que a disposição da sala da Loja (templo) utilizada pelos “Antigos” ingleses, logo
acabaria servindo também de modelo para a constituição topográfica da Loja do
REAA.
O principal ponto a esse respeito é que tal
como no Rito de York, o espaço de trabalho (a Loja) era todo no mesmo nível, isto
é, no mesmo plano e sem a separação e elevação do Oriente. Também, como na forma
antiga, o 2º Vigilante ocupava lugar ao meridiano do Meio-Dia (centro da banda Sul
do espaço).
Diferente dos “antigos”, o Grande Oriente
da França e os seus então ritos, Moderno e Adonhiramita, traziam Oriente
elevado e separado, tendo os seus Vigilantes invertidos, ficando ambos
posicionados no extremo do Ocidente.
No entanto, com o advento das Lojas Capitulares
(hoje já extintas), houve a necessidade de adaptações que comportassem ao mesmo
temo o simbolismo e o Capítulo do REAA. Assim, o ambiente que era todo no mesmo
plano acabou tendo o seu espaço oriental destacado do ocidental. Isso resultou
na demarcação e elevação do Oriente da Loja. Como visto acima, o modelo do
Oriente elevado, principalmente por influência do GOF, se deve também ao formato
comum do da Loja do Rito dos Sete Graus, ou Rito o Moderno.
Todavia, anos mais tarde, após a extinção
das Lojas Capitulares, o templo do REAA, ao contrário de retornar ao seu modelo
original, permaneceu mantendo o Oriente elevado e dividido.
Graças a isso, houve uma reestruturação no
modelo do simbolismo iniciático do Rito, de tal modo que o Oriente - outrora o santuário
Rosa Cruz capitular - agora era reservado aos Mestres Maçons, Ex-Veneráveis e Autoridades.
Dessa maneira firmava-se no templo a alegoria solar do caminho iniciático, cujo
começo (Aprendiz) ocorre a partir do topo da Coluna do Norte, passando pelo topo
do Sul (Companheiro) e se encerra ao alcançar o destino final no Oriente (Mestre).
Em primeira análise eu diria que inicialmente
esse foi o conjunto de mudanças mais retumbantes no simbolismo do REAA, ao
ponto de se consagrar definitivo e básico para a estrutura doutrinária do Rito
(consuetudinário).
Ao longo do tempo e especialmente nos
países latinos, os rituais para o simbolismo do REAA acabariam sofrendo
inúmeras intervenções. Muitas delas por “achismo”, outras por invencionices e
outras ainda como produtos enxertados de outros ritos. Algumas, entretanto, de
aperfeiçoamento.
Em tempos primitivos, a exemplo do Brasil,
a obscuridade ritualística progredia muito em face às dificuldades de
comunicação. Notadamente, a própria história da Maçonaria Brasileira contribuiu
muito para o aparecimento de elementos antagônicos à originalidade litúrgica do
REAA, sobretudo no século XIX e boa parte do XX. Na montagem de uma grade de
pesquisa, esse é um ponto relevante que merece ser investigado.
Não resta dúvida que vários outros fatores
também viriam contribuir para a “colcha de retalhos” encontrada em muitos
rituais simbólicos do REAA. Tantas foram as inserções indevidas que seria
demasiado estafante tentar aqui reproduzi-las.
No rigor da razão, cada ritual, seja ele
aceitável ou contraditório, possui a sua história e é nela que se pode
encontrar o fio de Ariadne capaz de conduzir o pesquisador a uma fonte de água
limpa. Uma das regras mais importantes para se encontrar a saída desse labirinto
é não acreditar de maneira generalizada que antiguidade seja sinônimo de
originalidade, sobretudo quando se trata de rituais, principalmente aqueles
nascidos na Maçonaria Tupiniquim. O cuidado deve ser dobrado quando da escolha
do roteiro bibliográfico.
Dada a complexidade desse assunto e
abreviando essa abordagem, seguem abaixo alguns tópicos encontrados nos rituais
adotados pelas Obediências Regulares e que podem ser perscrutados e avaliados
quanto à sua autenticidade ou não no simbolismo do REAA.
a)
Paredes do templo pintadas de azul - a Loja Mãe
Escocesa em 1804 determinava o matiz encarnado como referência do escocesismo;
b)
Aventais de Mestres com rosetas e debruados em
azul - o Conselho de Lausanne, Suíça, realizado em 1876 determinava, dentre
outros, aventais debruados em vermelho trazendo ainda as iniciais M∴ B∴;
c)
Altar dos Juramentos próximo e à frente do
Altar ocupado pelo Venerável Mestre – alguns rituais trazem esse altar no
centro do Ocidente – desde as Lojas Capitulares o Altar dos Juramentos é uma
extensão do Altar principal, portanto, fica no Oriente. Era mobiliário móvel
para servir ao simbolismo e era colocado no limite com o Ocidente quando
houvesse uma tomada de juramento de graus simbólicos. O simbolismo não
adentrava o Oriente.
d)
Diáconos
não portam bastão no REAA – foram introduzidos no REAA como antigos oficiais de
chão e a sua função é apenas e tão somente para atuar na transmissão da palavra
sagrada. É um cargo originário da Maçonaria anglo-saxônica;
e)
Formação de pálio no REAA – encontram-se rituais
que adotam essa prática, contudo, os Diáconos, como mensageiros atuam apenas na
transmissão da palavra (não usam bastão);
f) Cerimonial
para acendimento de luzes no REAA - é prática de outro rito e originalmente não
faz parte da liturgia do rito em questão. Primitivamente, no REAA as luzes
litúrgicas eram acesas pelo Arquiteto antes do ingresso dos Irmãos no templo.
g) As Colunas Vestibulares B∴ e J∴.
Por serem vestibulares, de vestíbulo, originalmente são exteriorizadas e ficam
junto à porta no átrio do templo. Há ritos que as trazem invertidas e
interiorizadas como de outros ritos.
E assim seguem muitos outros elementos,
mas que para elenca-los demandaria de muitas e muitas laudas. Os acima expostos
já podem dar ideia do porquê da “colcha de retalhos”. Como dito, avaliar o certo
e o errado depende de estudo sério e acurado.
Ao concluir alerto ao pesquisador que é fundamental
o conhecimento da história do rito, suas origens, sua proposta doutrinária, costumes
e outras particularidades. Alerto que nada está pronto no campo da pesquisa em
Maçonaria. É preciso antes buscar os elementos apropriados para se construir o
mosaico da sua história.
T.F.A.
PEDRO JUK
http://pedro-juk.blogspot.com.br
ABR/2023
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